Renascimento: tudo sobre a arte renascentista
O Renascimento é o período histórico da Europa que sucede à Idade Média, com início em meados do século XIV até finais do século XVI. Porém, não há um marco, acontecimento ou data específica para o início desse período, sendo que aconteceu de forma natural e gradual.
Como tudo começou
Foi o poeta Petrarca (1304, Arezzo, Itália-1374, Arquà Petrarca, Itália) que despertou a veia revolucionária do Renascimento, apelando à veneração da Antiguidade Clássica (época que antecedera a Idade Média).
Este apelo foi repetido antes, várias vezes, durante o período da Idade Média, mas apenas então os seus ecos foram escutados e a sua repercussão sentida.
Estava nascendo uma nova forma de pensar e de encarar o mundo, e a arte. Com o Humanismo o Homem passa a estar no centro do universo, e o teocentrismo dá lugar ao antropocentrismo. Há um regresso às ideias e glórias da época Clássica (greco-romana), um renascer dos ideais e cânones clássicos.
A era Romana começa a ser enxergada como uma época de luz e prosperidade, enquanto a era cristã (Idade Média) passa a ser encarada como uma época de trevas. E assim, o Renascimento vai se propor restaurar essa luz perdida.
Em resumo, ocorre um rinascità (renascimento) da Antiguidade Clássica, onde, segundo os entusiastas da Antiguidade, se alcançara o expoente da criação artística.
A Arte no Renascimento
Em termos artísticos o Renascimento vai suceder ao Gótico, e como característica principal tem a sua aproximação à Antiguidade. Mas o objetivo do artista renascentista não era de copiar a grandeza e excelência da arte Clássica, mas de igualar essas criações.
Durante este período os artistas (das Belas-Artes) deixam de ser considerados meros artesãos e passam a ser vistos como homens intelectuais. Esta mudança de atitude em relação ao artista levou ao colecionismo de obras de arte, pois tudo que saísse das mãos de um mestre era considerado de grande valor.
Surgem também as oficinas, que posteriormente levarão à criação das academias, e os artistas ganham mais liberdade, funcionando os mesmos quase como empresários.
Arquitetura
A arquitetura renascentista deve o seu arranque a Filippo Brunelleschi (1377-1446, Florença, Itália) que apesar de ter começado a carreira como escultor, se vai destacar como arquiteto.
Por volta de 1417-19, Brunelleschi vai competir pela construção de uma cúpula com Lorenzo Ghiberti (1381-1455, escultor italiano) contra quem perdera uns anos antes o concurso para as portas do Baptistério.
A referida cúpula deveria encimar a Catedral de Santa Maria del Fiore, edifício monumental que começara a ser construído na época medieval, e que continuaria em trabalhos de finalização até ao século XIX.
Devido à grandiosidade do edifício, até então todas as soluções para a construção da cúpula haviam falhado. Mas Brunelleschi consegue apresentar uma solução viável e dessa forma construir aquela que é considerada a primeira grande obra da renascença italiana.
A solução de Brunelleschi para a massiva cúpula foi não só revolucionária, como uma admirável vitória da engenharia. Esta consistiu na construção de dois grandes cascos separados ligados e inseridos um dentro do outro, de forma a que um reforçasse o outro e assim o peso da estrutura ficasse distribuído.
Além disso, Brunelleschi recusou também usar as técnicas habituais de transporte dos materiais, criando ele soluções engenhosas para tal, como máquinas que içassem os referidos materiais.
Os contributos de Brunelleschi vão muito além da grandiosa cúpula, pois ele se tornou no primeiro grande arquiteto da época moderna, introduziu ao Renascimento a perspectiva linear e fez regressar os arcos de volta-perfeita e as colunas em vez dos pilares.
Apesar de ter nascido e começado sua carreira em Florença é em Roma que o seu futuro se vai traçar. Junto com Donatello, Brunelleschi vai viajar para Roma e lá estudar as obras da Antiguidade Clássica e mais tarde adaptar métodos de construção da Roma Antiga nos seus edifícios, mas com diferentes proporções.
Brunelleschi vai usar processos geométricos e matemáticos de projeção do espaço como a perspectiva matemática, e a ele se deve outras descobertas científicas que usou a favor da arte, ajudando assim a elevar as Belas-Artes.
Essas descobertas de Brunelleschi foram recolhidas por escrito por Leone Battista Alberti (1404, Génova, Itália-1472, Roma, Itália), que escreveu os primeiros tratados de pintura (dedicado a Brunelleschi e que contém referência a Donatello, amigo comum dos dois) e escultura do Renascimento, e começou um sobre a arquitetura.
Alberti foi um homem muito culto, humanista e de sociedade, e depois da morte de Brunelleschi começou a exercer a atividade tornando-se também ele um dos grandes arquitetos do Renascimento.
Acreditando que o círculo era a forma mais perfeita, logo, a mais próxima do divino, Alberti vai dar predileção a plantas centradas para as igrejas, inspirando-se sobretudo no Panteão de Roma, apesar de tais plantas serem pouco convenientes ao culto católico. Porém, e depois que seu tratado se torna famoso, a planta centrada acaba sendo aceita e foi muito usada no Renascimento Pleno.
De uma forma geral a arquitetura do Renascimento é caraterizada por um revivalismo clássico, sendo que as ordens arquitetônicas (dórica, jônica, coríntia, toscana e compósita) retornam, assim como o arco de volta-perfeita.
Na projeção e construção dos edifícios segue-se um rigor matemático, e há também uma separação definitiva entre a arquitetura e a escultura e a pintura, pois a imponente grandiosidade da nova arquitetura não permitia à escultura ou à pintura qualquer destaque, brilhando ela própria sozinha sem mais ajuda.
Escultura
Com o Gótico a escultura arquitetônica quase desapareceu e a produção escultórica estava mais centrada em imagens de devoção e sepulcros, por exemplo. Mas com o Renascimento a escultura vai recobrar a sua independência em relação à arquitetura.
O primeiro passo nesse sentido é dado pelo grande escultor do Proto-Renascimento, Donatello (1386-1466, Florença, Itália), com a obra San Marcos, uma escultura em mármore. Esta, apesar de ter sido concebida para integrar um nicho de uma catedral Gótica, não necessita do enquadramento arquitetônico para se destacar.
É com Donatello que as figuras escultóricas começam a perder a rigidez do Gótico, sendo estas já dotadas de flexibilidade e padrões de beleza e proporções próximas das da antiguidade Clássica.
Donatello aperfeiçoou também a técnica do schiacciato (achatado), um baixo-relevo pouco saliente dotado de profundidade pictórica.
A escultura renascentista vai reavivar também a sensualidade do corpo nu tão característica da época clássica, sendo que o primeiro grande exemplo disso é o Davi de Donatello. Esta é a primeira escultura independente, de tamanho natural e totalmente nua desde a Antiguidade.
Outro grande escultor do Proto-Renascimento foi Andrea Del Verrocchio (1435, Florença, Itália-1488, Veneza, Itália), que à semelhança de Donatello vai executar esculturas de grande vulto, como a estátua equestre de Bartolomeo Colleoni. Verrocchio foi também pintor e mestre de Leonardo Da Vinci, e por isso a sua obra pictórica nunca mais se livrou de comparações com as obras do seu pupilo.
De uma forma geral, a escultura renascentista, recuperando a sua independência, ganha grandiosidade, volume e realismo. Há um ressurgimento do busto-retrato tão comum da Antiguidade impulsionado também pelo colecionismo que se tornara popular no Renascimento. Assim, os artistas vendo uma possibilidade de negócio aí vão produzir bustos, baixos-relevos e pequenos bronzes que facilitavam a mobilidade das peças.
Pintura
Sendo que os primeiros passos rumo ao Renascimento foram dados primeiramente pela escultura e pela arquitetura, a pintura vai seguir o mesmo caminho cerca de uma década depois, espelhando nas suas composições os feitos destas.
Os primeiros passos da pintura no Renascimento foram dados pelo jovem Masaccio (1401, San Giovanni Valdarno, Itália-1428, Roma, Itália) que tragicamente faleceu prematuramente, apenas com 27 anos.
Logo nas primeiras obras de Masaccio se percebe sua aproximação a Donatello e um distanciamento em relação a Giotto, mestre do Gótico e conterrâneo do jovem mestre. Também nas figuras de Masaccio as roupagens são independentes do corpo, sendo representadas como verdadeiro tecido, assim como os cenários arquitetônicos envolvendo as figuras são representados respeitando a perspectiva científica desenvolvida por Brunelleschi.
Assim lançou Masaccio as principais sementes da pintura renascentista que, ao contrário do Gótico que favorecia a representação imaginada das coisas, vai preferir a representação exata do real.
A profundidade dos interiores representados na pintura renascentista são possíveis de medir, e os mesmos transmitem a ideia de que se as figuras quisessem poderiam se movimentar à vontade.
Depois de Masaccio, Andrea Mantegna (1431, República de Veneza-1506, Mântua, Itália) foi o pintor mais importante do Proto-Renascimento, sendo também este um gênio precoce que aos dezessete anos já executava encomendas sozinho.
Mas é com Sandro Botticelli (1445-1510, Florença, Itália) que a pintura começa a ganhar mais movimento e graciosidade, apesar de este não compartilhar da visão anatômica mais poderosa e musculada que vai caracterizar o Renascimento, pois seus corpos são mais etéreos, porém, bastante voluptuosos e sensuais.
Botticelli foi o pintor favorito de Lourenço de Médici (grande mecenas da arte renascentista e governante da cidade de Florença), e é para ele que Botticelli vai pintar sua obra mais famosa, O Nascimento de Vênus (ver primeira imagem do artigo).
De uma forma geral, na pintura predomina a técnica do óleo por oposição ao fresco, o que propiciou que as obras pictóricas se tornassem mais móveis. Proliferam também os retratos.
Os princípios aplicados à arquitetura, como o rigor matemático das proporções e a perspectiva são usados na pintura, e nas composições pictóricas as figuras são agora enquadradas na arquitetura falsa ou paisagem à escala, respeitando as proporções de cada elemento, conferindo assim profundidade e mais realismo à pintura.
O Renascimento Pleno
A fase final do Renascimento Italiano é conhecida como Renascimento Pleno e é o expoente do que até então fora sendo cultivado. Nesta fase desenvolve-se o culto ao gênio, algo que acaba empurrando alguns artistas para tentarem alcançar o impossível, como a busca da perfeição absoluta.
Nesta fase o foco dos artistas está mais na efetividade das obras, na forma como estas mexeriam com as emoções dos espectadores, do que com o rigor racional ou os precedentes clássicos, e assim que algumas obras dos grandes mestres do Renascimento Pleno foram criadas, foram logo consideradas clássicas, únicas, incomparáveis e inimitáveis.
Dessa forma o Renascimento Pleno, herdeiro do Proto-Renascimento, é único e muito exclusivo, e apesar de influenciar a arte posterior, foi um casulo sem metamorfose.
LEONARDO DA VINCI
Leonardo da Vinci (1452, Anchiano ou Vinci (?), Itália-1519, Château Du Clos Lucé, Amboise, França) é considerado o primeiro grande mestre do Renascimento Pleno. Foi aprendiz na oficina de Verrocchio e sua mente curiosa o levou a enveredar por áreas distintas como a escultura, a arquitetura ou a engenharia militar, porém foi a pintura que imortalizou o seu nome elevando-o à categoria de gênio e mito.
Nas obras de Leonardo a luz tem uma importância grande, e durante a sua vida artística ele vai desenvolver e aperfeiçoar a utilização do claro-escuro (chiaroscuro). Outra característica da sua pintura é o sfumato que confere às suas composições um esbater das formas, uma diluição dos contornos na paisagem através da utilização da luz, por oposição aos mestres do Proto-Renascimento que favoreciam o sobressair dos contornos.
Também aperfeiçoou a perspectiva aérea, e as figuras representadas nas suas obras são predominantemente andróginas e enigmáticas. Há também uma importância atribuída ao gesto e com frequência encontramos nas pinturas de Leonardo figuras que se expressam através de gestos contundentes.
Em termos de técnica tinha predileção pelo óleo, o que no caso da Última Ceia se revelou terrível para a conservação da pintura, pois apesar de ser um afresco, Leonardo não usou têmpera a ovo como era comum, mas a óleo, o que provocou que pouco tempo depois de estar concluída a mesma se começasse a deteriorar.
BRAMANTE
Donato Bramante (1444, Fermignano, Itália-1514, Roma, Itália) é um dos principais arquitetos do Renascimento e aquele que coloca em prática o novo estilo na perfeição. Ele vai aplicar o princípio de "parede esculpida" de Brunelleschi com excelência, o que confere aos seus edifícios uma maior imponência e distinção.
O seu grande momento chegou quando o Papa Júlio II lhe encomendou a construção de uma nova basílica de São Pedro, algo que Bramante tomou como oportunidade para conceber uma grandiosa planta que iria suplantar os dois maiores edifícios da Antiguidade, o Panteão e a Basílica de Constantino.
Para tão grandioso projeto, e por razões de logistica e de dinheiro, Bramante foi buscar uma velha técnica do tempo romano, a construção em betão, algo que mais tarde viria se afirmar e revolucionar o mundo da arquitetura. Ainda assim, o projeto sofreu várias alterações até ao começo das obras, e da ideia original de Bramante resta apenas uma gravura da planta.
As obras de construção foram lentas e quando Bramante morreu pouco havia sido até então construído. O projeto foi então conduzido por arquitetos que haviam sido treinados por Bramante, mas só em 1546, com Michelangelo, o edifício vai entrar na sua fase final de concepção e construção.
MICHELANGELO
Michelangelo di Lodovico Buonarroti Simoni (1475, Caprese Michelangelo, Itália-1564, Roma, Itália) foi pintor, escultor, poeta e arquiteto, e acima de tudo foi o que melhor encapsulou a ideia de gênio sob inspiração divina. Além disso, da sua obra e vida não se pode dissociar o drama e a tragédia, fazendo de Michelangelo o protótipo do artista solitário e torturado.
Michelangelo considerava a escultura como a mais nobre das artes, e ele se considerava um escultor em primeiro lugar. Com a sua obra tentou chegar ao divino e à perfeição absoluta, mas no final chegou à conclusão que falhara em ambas as frentes, apesar de a História lhe reservar um lugar de destaque na criação artística como um dos maiores, senão o maior artista de todos os tempos.
O corpo humano era para Michelangelo uma expressão do divino e representá-lo sem roupagens era a única forma de absorver toda sua divindade. Daí a sua obra estar recheada de corpos nus e possantes, pois ao contrário de Leonardo, cujas figuras parecem imbuídas de uma feminilidade latente, em Michelangelo o pendor é para o masculino.
Michelangelo é o artista que mais se aproxima dos clássicos da Antiguidade, muito pelo foco que colocou na imagem humana ao longo da sua obra. E o seu Davi, a primeira escultura monumental desta fase, é o melhor exemplo de todas as qualidades e características da arte de Michelangelo.
RAFAEL
Rafael Sanzio (1483, Urbino, Itália-1520, Roma, Itália) foi um artista e grande homem de sociedade. Contemporâneo de Michelangelo, a fama de ambos foi equiparada na época em que viveram, mas a História foi relegando Rafael para segundo plano como se a sua importância ou fama fosse menor que a de Michelangelo na época do Renascimento.
A história de Rafael carece de dramatismo ou do elemento trágico, ao contrário da de Michelangelo, e da sua obra não saíram tantas inovações. Porém, o seu gênio é inegável, assim como a sua contribuição para um estilo que ele representou melhor que qualquer um.
A sua vasta obra pictórica é um exemplo de fusão do que melhor se praticava no Renascimento Pleno, suportando as suas composições a candura e o lirismo de Leonardo, e o dramatismo e a força de Michelangelo. Rafael foi também um prolífero e exímio retratista.
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A Criação de Adão de Michelangelo
"A Criação de Adão" é um afresco pintado por Michelangelo no teto da Capela Sistina entre os anos de 1508 e 1510, a pedido do papa Júlio II.
O afresco integra um conjunto de pinturas que compõem o teto da Capela Sistina, onde Michalengelo representou várias cenas bíblicas e figuras proféticas. Entre elas, "A Criação de Adão" é a mais icônica, recebendo a admiração de todos os visitantes. Considerada a sua obra prima, rendeu a Michelangelo um enorme prestígio, tornando-o um dos maiores artistas da História.
O próprio tema da pintura chama a atenção. O artista representa uma importante passagem do Livro do Gênesis: o momento em que Deus cria o primeiro homem, Adão. Trata-se de uma narrativa, Michelangelo conta uma história através da imagem, capturando o instante no qual a vida humana está prestes a começar.
Composição da imagem e principais elementos
Deus, do lado direito, está representado como um homem mais velho, de barbas e cabelos brancos, símbolos de sabedoria, mas envergando uma forma física jovem e vigorosa. O artista toma por base os relatos bíblicos que descrevem a sua fisionomia.
Está envolto num manto, onde carrega os seus anjos. Com o braço esquerdo, abraça uma figura feminina, normalmente interpretada como sendo Eva, a primeira mulher, que ainda não foi criada e espera nos céus, junto do Pai.
Adão, do lado esquerdo, é um homem jovem e está sentado num prado, com o corpo dobrado, numa posição lânguida, como se tivesse acabado de acordar. Ainda sem forças, estende a mão em direção à imponente figura de Deus, esperando que Ele se aproxime para lhe transmitir a vida.
No centro, estão os dedos indicadores de ambos, com um pequeno espaço entre si, realçado pelo vazio na pintura que não deixa nenhuma distração para o olhar de quem observa.
O braço de Adão está dobrado e o seu dedo caído, sinais de fraqueza do homem, por oposição à postura de Deus, com o braço estendido e o dedo esticado, sublinhando o gesto do seu poder criador.
Os membros são simétricos, têm uma constituição muito parecida, fazendo referência à passagem bíblica "Deus criou o homem à sua imagem e semelhança" (Gênesis, 1:27). Assim, através desta simetria, Michelangelo estabelece um equilíbrio entre os dois lados do afresco, entre a figura divina e a figura humana.
Note-se também a antecipação, o compasso de espera ao qual a imagem nos conduz; embora muito próximos, os dedos não chegam a se tocar realmente.
Anatomia humana e possível mensagem subliminar
Outra interpretação mais recente, apontada por alguns estudiosos, é de que as dobras do manto criam o exato formato de um cérebro humano, no centro do qual está Deus. Esta teoria foi pela primeira vez formulada, em 1990, por um cirurgião americano que depois de visitar o Vaticano partilhou a sua descoberta com o resto do mundo.
Na imagem estariam representadas as diferentes partes do cérebro (lobo frontal, nervo ótico, glândula pituitária e cerebelo), o que parece possível, já que o artista tinha vastos conhecimentos de anatomia.
O pensamento da época contribui para esta hipótese, porque colocava o Homem no centro de tudo e valorizava suas descobertas científicas e filosóficas. Assim, o toque de Deus em Adão poderia ser interpretado como símbolo do racionalismo.
Renascimento, Humanismo e Racionalismo
O Renascimento foi um período da História europeia, entre o final do século XIV e o começo do século XVI. Caracterizado pelo retorno às referências culturais e artísticas da antiguidade clássica, se assumiu como um movimento de redescoberta do mundo e do Homem.
O princípio fundamental da época era o Humanismo, que se afastava do estudo das escrituras e prestava mais atenção nas ciências humanas como a Filosofia, a Retórica e a Matemática, colocando o foco no Homem acima de todas as coisas (antropocentrismo).
Na mesma linha, surgiu o Racionalismo, corrente filosófica que defendia que a verdade absoluta apenas poderia ser conhecida através da razão humana.
Então, o raciocínio lógico inato aos seres humanos, quando trabalhado e exercitado através de operações mentais e questionamentos, seria a única fonte de verdadeiro conhecimento.
Curiosidades acerca da pintura "A Criação de Adão"
Um fato interessante sobre a criação da obra é que Michelangelo se sentiu pressionado a aceitar o convite do papa Júlio II para pintar o Teto da Capela Sistina, uma vez que preferia se concentrar no seu trabalho como escultor.
Outro detalhe curioso é que o dedo indicador de Adão, uma das partes mais reproduzidas e famosas da imagem, não foi pintado por Michelangelo. O original foi danificado por um desabamento, sendo posteriormente pintado por um restaurador do Vaticano.
Sobre Michelangelo
Michelangelo di Lodovico Buonarroti Simoni nasceu em Caprese, Itália, no dia 6 de março de 1475. Durante mais de sete décadas, trabalhou em várias disciplinas artísticas (pintura, escultura, arquitetura e poesia), nas cidades de Florença e Roma, onde viveram os seus mecenas, entre os quais se destacaram a família Medici e alguns papas romanos.
Em 1505, Michelangelo se dedicou inteiramente a um projeto de escultura, o túmulo do papa, mas acabou sendo preterido por outro artista. No ano seguinte, foi convidado para pintar o teto da Capela Sistina e recusou por dois anos, se sentindo menosprezado, porque considerava a pintura uma arte menor.
Em 1508, não podendo mais resistir à pressão da Igreja, acabou aceitando o trabalho e durante quatro anos aproveitou para mostrar os seus talentos e dons artísticos. Produziu obras muito célebres que ainda são ícones na cultura ocidental, como as esculturas "A Pietà", "David" e "Baco" e as pinturas "A Criação de Adão" ,"Juízo Final", entre outras.
Michelangelo morreu de febre, no dia 18 de fevereiro de 1564, em Roma. Foi um dos grandes gênios do seu tempo, ficando eternizado na História da Arte como um dos maiores criadores do mundo ocidental.
Afrescos do Teto da Capela Sistina
Na Capela Sistina encontra-se uma das obras mais emblemáticas de toda a Renascença Italiana e que hoje é uma das mais famosas do mundo. O teto da Capela Sistina foi pintado com a técnica afresco por Michelangelo Buonarroti, obra que foi encomendada pelo Papa Júlio II (1443- 1513).
Como Michelangelo tinha declarada preferência pela escultura, que considerava como a arte maior, e se reconhecia como um escultor acima de tudo, foi com relutância que ele aceitou a convocatória do Papa.
A obra começou a ser realizada em 1508 e terminou em 1512, naquilo que foi uma impressionante empreitada, tendo em conta que o artista terá feito a totalidade da obra sozinho e deitado.
Análise das Pinturas do Teto
A divisão principal do teto está feita em nove painéis que representam cenas do livro do Gênesis. Esta escolha do tema teológico estabelece uma ligação entre os primórdios da história do homem e a vinda de Cristo, sendo que a figura de Cristo não se encontra presente na composição pictórica do teto.
As figuras, ainda que pictóricas, são influenciadas pela escultura e percebe-se a importância que o desenho tem na obra do artista. Da mesma forma, as imagens revelam o domínio do artista na representação e conhecimento da anatomia humana.
As figuras são predominantemente fortes, enérgicas, poderosas, mas também elegantes. Ao longo do espaço imagens gigantescas e musculadas contorcem-se quase de forma impossível, atribuindo movimento a toda a composição e também uma energia positiva.
Essa vivacidade da composição é certamente um reflexo do momento histórico que a Itália vivia e que em breve se espalharia por toda Europa. Não era apenas a renascença da arte clássica que se respirava, mas também uma redescoberta da filosofia grega e do humanismo romano.
Uma nova Europa estava nascendo, deixando para trás a Idade Média e entrando na Idade Moderna, onde o centro do 'mundo' passa a ser o Homem.
Os nove painéis contam a história da criação. O primeiro representa a luz sendo separada das trevas; o segundo retrata a criação do sol, da lua e dos planetas e o terceiro representa a terra sendo separada do mar.
A criação de Adão
O quarto painel é a criação de Adão, uma das imagens mais difundidas e reconhecidas mundialmente. Aqui Adão está languidamente recostado, como se com preguiça e quase que obrigando Deus a um último esforço para conseguir tocar nos dedos de Adão e assim lhe poder dar a centelha da vida.
Ao contrário da figura "preguiçosa" de Adão, Deus é dotado de movimento e energia e até os seus cabelos se movem com a brisa invisível. Debaixo do seu braço esquerdo, Deus leva a figura de Eva que intimamente segura no seu braço e pacientemente espera que Adão receba a centelha da vida para também ela poder recebê-la.
No quinto painel (e central) vemos por fim a criação de Eva; no sexto temos a expulsão do paraíso de Adão e Eva; no sétimo está representado o sacrifício de Noé; no oitavo o dilúvio universal e no nono, que é o último, a embriaguez de Noé.
Ladeando os painéis temos ainda a representação alternada de Profetas (Zacarias, Joel, Isaías, Ezequiel, Daniel, Jeremias e Jonas) e Sibilas (Délfica, Eritrea, Cumana, Pérsica e Líbica). Esta é uma justaposição entre cristianismo e paganismo, naquilo que alguns historiadores consideram ter sido uma forma sutil encontrada pelo artista para criticar a Igreja.
Os painéis, e restante composição pictórica, estão emoldurados por elementos arquitetônicos pintados (incluindo figuras escultóricas) com extremo realismo e com os quais as figuras interagem. Alguns sentam-se, outros recostam-se, nesses elementos de arquitetura falsa.
Nos quatro cantos do teto temos ainda a representação das quatro grandes salvações de Israel, e espalhadas pelo centro da composição, vemos ainda vinte figuras masculinas nuas sentadas, conhecidas como os “Ignudi”, nome atribuído pelo próprio artista.
Estas figuras aparecem em pares de quatro rodeando cinco dos nove painéis do teto, nomeadamente no “embriaguez de Noé”, no “sacrifício de Noé”, na “criação de Eva”, na “separação da terra do mar” e na “separação da luz e da escuridão”. Porém, não se sabe exatamente o que representam nem qual a razão da sua inclusão.
O Juízo Final
Mais de vinte anos depois, Michelangelo regressou à Capela Sistina para executar O Juízo Final (1536-1541) um afresco pintado na parede do altar da Capela. Este trabalho foi encomendado a Michelangelo pelo Papa Clemente VII (1478- 1534), mas a obra só teria início após a morte desse Papa e já sob o pontificado de Paulo III(1468- 1549).
Contrastando com a vitalidade, o ritmo e a energia radiante dos afrescos do teto, a representação do Juízo Final é sombria e uma composição de corpos sem real estrutura. No total estão representados trezentos e noventa e um corpos, originalmente retratados a nu (incluindo a Virgem).
A composição é dominada pela figura central de um Cristo juiz implacável e temível. Como fundo temos um céu que se rasgou e na parte inferior vemos como os anjos tocam as trombetas anunciando o Juízo Final.
Ao lado de Cristo a Virgem olha para o lado, como que recusando-se a enxergar o caos, a miséria, o sofrimento e como todos os pecadores vão ser lançados no inferno.
Uma das figuras representadas é São Bartolomeu que em uma mão segura a faca do seu sacrifício e na outra a sua pele esfolada, e na qual Michelangelo decidiu conceber seu autorretrato. Assim, a cara deformada da pele esfolada é a do próprio artista, talvez uma metáfora para representar a sua alma torturada.
As diferenças entre as pinturas do teto e da parede do altar estarão relacionadas com a diferente contextualização cultural e política na época em que a obra foi realizada.
A Europa vivia uma crise espiritual e política, começavam os anos da Reforma que dariam lugar à cisão dentro da Igreja, e parece que esta composição serve como aviso que os inimigos da Igreja estão condenados. Não há perdão, pois Cristo é implacável.
Como todas as figuras desta obra foram pintadas a nu, nos anos que se seguiram a controvérsia foi aumentando de tom, pois muitos foram os que acusaram a Igreja de hipocrisia e consideravam a pintura de pornografia.
Durante mais de vinte anos os difamadores da obra fizeram questão de espalhar a ideia de que a Igreja estava albergando em uma das suas principais instalações uma obra pornográfica, fazendo também campanha insistente para que as pinturas fossem destruídas.
Temendo o pior, a Igreja, na pessoa do Papa Clemente VII (1478- 1534) encomendou que alguns nus fossem repintados, em uma tentativa de preservar a obra original, impedindo assim a sua destruição. Esse trabalho foi realizado por Daniele da Volterra no ano da morte de Michelangelo.
Trabalhos de Restauração
As mais recentes intervenções (1980 e 1994) de restauração na Capela Sistina, focadas na limpeza dos afrescos, revelaram um lado de Michelangelo que estava sendo ignorado pelos historiadores, não intencionalmente.
Até então apenas a forma e o desenho eram louvados nessa obra, atribuindo-se o foco ao desenho em detrimento da cor. Porém, a limpeza de séculos de sujeira e fumo de velas revelou uma vibrante paleta de cores na obra original de Michelangelo. Dessa forma provando que o artista não só era um gênio do desenho e da escultura, mas também um excelente colorista ao nível do próprio Leonardo Da Vinci.
A Capela Sistina
A Capela Sistina (1473-1481) situa-se na residência oficial do Papa, no Palácio Apostólico no Vaticano, e a sua construção foi inspirada no Templo de Salomão. É lá que o Papa conduz missa pontualmente, e é também aí que o Conclave se reúne para eleger um novo Papa.
A Capela serviu de atelier para alguns dos maiores artistas da Renascença italiana, não só Michelangelo, mas também Rafael, Bernini e Botticelli.
Mas é inegável que hoje a simples menção do nome da Capela nos remete para os seus grandiosos afrescos do teto e altar executados por Michelangelo.
Michelangelo Buonarotti
Michelangelo (1475-1564) foi um dos maiores vultos da Renascença e é considerado um dos maiores gênios da arte de todos os tempos. Ainda em vida já assim era considerado, e a si próprio ele atribuía capacidades acima da média.
Alegadamente de trato difícil a sua genialidade foi, no entanto, reconhecida quando ele era ainda muito jovem. Frequentou a oficina de Domenico Ghirlandaio e aos quinze anos Lourenço II de Médici o tomou sob a sua proteção.
Humanista e fascinado pela herança clássica (que à data experimentava o seu mais importante revivalismo artístico), a obra de Michelangelo centra-se na imagem humana como essencial veículo de expressão. Nessa preferência é também evidente a forte influência no artista da escultura clássica.
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Michelangelo foi um dos grandes gênios da Renascença italiana, e até hoje seu nome sobrevive como um dos maiores e mais importantes artistas de todos os tempos. Aqui olharemos para 9 das suas principais obras.
1. Madonna da Escada
A Madonna da Escada é um baixo relevo em mármore esculpido entre os anos 1490 e 1492. A obra foi acabada antes de Michelangelo completar 17 anos e quando ainda estudava nos jardins dos Medici, em Florença, com Bertolo di Giovanni.
Neste baixo relevo está representada a Virgem sentada em umas escadas segurando e cobrindo seu filho, que estará dormindo, com um manto.
As escadas completam o resto do fundo e em segundo plano, no topo dessas escadas, vemos duas crianças (putti) brincando, enquanto uma terceira está reclinada sobre o corrimão.
Uma quarta criança encontra-se atrás da Virgem e estará ajudando a criança reclinada a esticar um lençol (alusão ao sudário da Paixão de Cristo) que ambos seguram.
Nesta obra destaca-se a herança clássica, helenística, romana, e nela encontramos a ideia de ataraxia (conceito da filosofia epicurista) que consiste na ausência de inquietação do espírito.
A diferença entre este conceito e a apatia é que na ataraxia não há a negação ou eliminação dos sentimentos, mas promove a felicidade tentando encontrar forças para superar a dor e as dificuldades.
Assim, a Virgem está impassível na contemplação do sacrifício futuro do seu filho, não porque não esteja sofrendo, mas porque deve encontrar formas de superar essa dor estoicamente.
Para a realização deste baixo relevo, Michelangelo fez uso de uma técnica de Donatello (1386 - 1466, escultor renascentista italiano), o "sticiatto" (achatado).
2. Centauromaquia
Realizado depois da Madonna da Escada, Centauromaquia (Batalha dos Centauros), é um relevo em mármore executado por volta de 1492, quando Michelangelo ainda estudava pelos jardins dos Medici.
Nele encontra-se representada a batalha entre os Centauros e os Lápidas, quando em pleno casamento da princesa Hipodâmia e Pirítoo (rei dos Lápitas), um dos centauros tentou raptar a princesa, acontecimento que deu lugar à batalha entre as partes.
Os corpos encontram-se contorcidos e emaranhados, tornando difícil distinguir quem é quem. Uns enlaçados em outros, alguns pelo chão derrotados, todos transmitem a urgência e desespero de uma batalha.
Com esta obra o jovem Michelangelo assume já a sua obsessão com o nu, pois para ele a beleza humana era uma expressão do divino e por isso contemplar uma obra que representa essa beleza através da nudez, é contemplar a excelência de Deus.
Este relevo encontra-se intencionalmente inacabado, algo característico na obra de Michelangelo, que assim assume também desde cedo o incompleto como categoria estética, o "non finito".
Aqui apenas partes dos corpos (maioritariamente os troncos das figuras) se encontram trabalhadas e polidas, enquanto as cabeças e pés estão incompletos.
3. Pietà
Devido ao impacto da morte de Lorenzo de' Medici em 1492, Michelangelo deixou Florença rumo a Veneza e posteriormente Bolonha, regressando a Florença apenas em 1495, mas imediatamente rumando até Roma.
E foi em Roma que em 1497 o cardeal francês Jean Bilhères de Lagraulas encomenda ao artista uma Pietà em mármore para a Basilica di San Pietro no Vaticano.
A Pietà de Michelangelo é uma escultura em mármore executada entre os anos de 1498 e 1499, e é uma das maiores aproximações no campo da arte à completa perfeição.
Aqui Michelangelo rompe com o convencional e resolve representar a Virgem mais jovem que seu filho. De incrível beleza, ela segura Cristo que jaz morto em suas pernas.
Ambas as figuras transmitem serenidade, e a Virgem resignada contempla o corpo sem vida de seu filho. O corpo de Cristo é anatomicamente perfeito, e os panejamentos são trabalhados até à perfeição.
Em oposição ao "non finito", esta escultura é o "finito" por excelência. Toda a obra está excecionalmente polida e acabada, e com ela talvez Michelangelo tenha alcançado a verdadeira perfeição.
O artista sentiu-se tão orgulhoso desta escultura que esculpiu a sua assinatura (sendo que este é o único mármore assinado por Michelangelo) na fita que divide o peito da virgem com as palavras: "Michael Angelus Bonarotus Floren. faciebat".
4. Davi
Em 1501 Michelangelo regressa a Florença e desse retorno nasce o Davi, uma escultura em mármore com mais de 4 metros realizada entre os anos 1502 e 1504.
Aqui a representação de Davi é feita antes do confronto com Golias, sendo que assim Michelangelo inova ao representar a figura não vencedora, mas cheia de ira e vontade de enfrentar o seu opressor.
O Davi é um fascinante exemplo da força motor por trás da obra deste artista, quer na escolha do nu completo, quer na turbulência interior que a figura deixa transparecer.
Esta escultura tornou-se em um símbolo para a cidade de Florença do triunfo da democracia contra o poder dos Medici.
5. Tondo Doni
Michelangelo e Leonardo da Vinci foram os dois maiores e mais expressivos nomes saídos da Renascença italiana. Até hoje as suas obras inspiram e causam admiração, mas enquanto em vida e sendo contemporâneos, os dois nunca concordaram e chocaram diversas vezes.
Um dos principais motivos de choque entre os artistas era o declarado desdém que Michelangelo sentia pela pintura, sobretudo a óleo, a qual ele considerava apenas própria para mulheres.
Para ele a verdadeira arte era a escultura, pois apenas através da força física se poderia obter a excelência.
A escultura era masculina, não permitia erros, nem revisões, ao contrário da pintura a óleo, técnica preferida por Leonardo, que permitia que a pintura fosse executada por camadas, assim como permitia constantes correções.
Para Michelangelo, na pintura apenas a técnica de afresco se aproximava da primazia da escultura, porque por ser uma técnica executada sobre uma base fresca, requeria precisão e rapidez, não permitindo erros ou correções.
Assim, não é de estranhar que em uma das poucas obras de pintura móvel atribuídas ao artista, o Tondo Doni, este tenha utilizado a técnica de têmpera sobre painel em "tondo" (círculo).
Esta obra foi realizada entre os anos 1503 e 1504. Nela está representada uma sagrada família pouco convencional.
Por um lado a mão esquerda da Virgem parece estar tentando agarrar o sexo do filho. Por outro em volta da família que se encontra em primeiro plano, estão várias figuras desnudas.
Estas figuras, os "Ignudi", aqui adolescentes, voltarão mais tarde a ser representados em uma outra obra de Michelangelo (no teto da Capela Sistina), mas aí com aspeto mais adulto.
6. Afrescos da Capela Sistina
Em 1508 Michelangelo iniciou uma das suas obras mais notáveis a pedido do Papa Júlio II que o chamara a Roma anos antes para que o artista projetasse e realizasse seu túmulo.
Conhecido o seu desprezo pela pintura, foi contrariado que Michelangelo aceitou a obra e durante a mesma redigiu várias cartas nas quais demonstrou seu descontentamento.
Porém, os afrescos da Capela Sistina são uma impressionante façanha que ainda hoje deslumbra e impressiona o mundo.
O teto
De 1508 a 1512, Michelangelo pintou o teto da Capela. Esse foi um trabalho intensivo e no qual há o total domínio quer da técnica do "buon fresco" (afresco) quer do desenho.
Pois esta técnica requer que se pinte em reboco úmido, o que significa que o processo deve ser rápido e não pode haver correções ou repinturas.
Assim, é impressionante imaginar que durante 4 anos o artista pintou deitado, um espaço cerca de 40 por 14 metros, figuras colossais e coloridas, confiando apenas no seu desenho.
Sofreu com as escorrências do produto que chegavam a afetar sua visão, e com o isolamento e o desconforto da posição em que trabalhava. Mas o resultado desses sacrifícios é uma das maiores realizações no campo da pintura.
O teto encontra-se divido em 9 painéis, separados por arquitetura falsa pintada. Nestes estão representadas cenas do livro do Gênesis, desde os inícios da história do Homem até à vinda de Cristo, sendo que Cristo não está representado no teto.
O primeiro painél representa a luz sendo separada das trevas; o segundo retrata a criação do sol, da lua e dos planetas; o terceiro representa a terra sendo separada do mar.
O quarto conta a história da Criação de Adão; o quinto é a criação de Eva; no sexto vemos a expulsão do paraíso de Adão e Eva.
No sétimo está representado o sacrifício de Noé; no oitavo o dilúvio universal e no nono e último, a embriaguez de Noé.
Nas laterais dos painéis estão representados alternadamente 7 Profetas (Zacarias, Joel, Isaías, Ezequiel, Daniel, Jeremias e Jonas) e 5 Sibilas (Délfica, Eritrea, Cumana, Pérsica e Líbica).
Emoldurando 5 dos 9 painéis do teto, encontram-se os "ignudi", vinte figuras masculinas completamente despedidas, em conjuntos de 4 por painel.
Nos quatro cantos do teto encontram-se ainda representadas as quatro grandes salvações de Israel.
O que mais sobressai nesta impressionante composição de corpos humanos emoldurados por arquiteturas e até esculturas falsas que contam histórias, é a expressividade, vivacidade e energia que transmitem.
Corpos musculados, masculinos (mesmo os femininos), contorcidos e coloridos espalham-se pelo espaço em movimentos captados para a eternidade, e que tanta influência iriam exercer sobre tendências e artistas que nasceriam depois da sua realização.
O Juízo Final
Em 1536, mais de vinte anos depois de concluído o teto, Michelangelo regressa à Capela Sistina, desta vez para pintar a parede do altar.
Tal como o nome indica, aqui está representado o Juízo Final, em uma composição pictórica de cerca de 400 corpos originalmente todos pintados a nu, incluindo a Virgem e Cristo.
Tal fato levou a uma grande controvérsia durante anos, que acabou com o cobrimento das partes íntimas das figuras realizado por outro pintor, ainda Michelangelo estava vivo.
Michelangelo pintou esta obra de proporções mais uma vez colossais, já com mais de sessenta anos.
Talvez por isso, ou pelo desencanto e paixões turbulentas que o atormentavam, ou talvez por tudo e pelo contexto histórico também, esta obra é tão diferente dos afrescos do teto.
Aqui pesa acima de tudo o pessimismo, o desencanto, o trágico desenlace do fim. Ao centro é a figura de Cristo como terrível juiz que domina a composição.
Aos seus pés, São Bartolomeu segura com a mão esquerda sua própria pele esfolada no ato do seu martírio, e no rosto dessa pele caía e enrugada, Michelangelo pintou seus próprios traços.
Ao lado de Cristo a Virgem esconde a cara de seu filho, e parece recusar-se a assistir ao lançamento no inferno das almas condenadas.
7. Túmulo de Júlio II
Em 1505 Michelangelo foi chamado a Roma pelo Papa Júlio II que lhe encomendou o seu túmulo. Inicialmente a sua visão era de um grande mausoléu, o que agradou bastante ao artista.
Mas além da grandeza da empreitada, o Papa, de personalidade inconstante, resolveu que queria ser sepultado na Capela Sistina.
Para isso primeiro a Capela necessitava de vários retoques, incluindo a pintura do teto e do altar, daí primeiro Michelangelo viu-se "obrigado" a pintar os acima referidos afrescos na Capela Sistina, tal como já vimos.
Mas o projeto inicial para o túmulo do Papa sofreria outras modificações e concessões. Primeiro com a morte do Papa em 1513 o projeto viu-se reduzido, e depois ainda mais quando a visão de Michelangelo choca com as ideias dos herdeiros do Papa.
Assim, em 1516 é redigido um terceiro contrato, porém, o projeto sofreria mais duas alterações em 1526 e depois em 1532. A resolução final determinou que o túmulo consistiria apenas de uma fachada, assim como alterou o local para a igreja de San Pietro in Vincoli, em Roma.
Moisés
Apesar de todos os contratempos relacionados com este túmulo, e de no final pouco do que fora sonhado para a sua concepção ter sido levado a cabo, Michelangelo trabalhou para ele durante três anos de forma intensiva.
Assim, de 1513 a 1515, Michelangelo esculpiu algumas das obras mais marcantes da sua carreira, e uma delas, o Moisés, é aquela que hoje reclama a visita de quem se desloca a San Pietro para ver o túmulo.
O Moisés é uma das esculturas que rivaliza em perfeição com a Pièta do Vaticano, e juntamente com outras, como é o caso dos prisioneiros ou escravos, destinavam-se a decorar o túmulo parietal.
Nesta escultura destaca-se a bravura e terrível olhar da figura (Terribilità), pois tal como o Davi esta possuí uma intensa vida interior, uma força que transcende a pedra da qual foi retirada a figura.
Imponente e acariciando sua longa e detalhada barba, Moisés parece garantir com seu olhar e expressão que todos aqueles que incumprirem serão castigados, pois nada escapa à ira divina.
Prisioneiros ou Escravos
Juntamente com Moisés, uma série de esculturas conhecidas como Prisioneiros ou Escravos, saíram dessa época intensa de trabalho.
Duas dessas obras estão acabadas, o Escravo Morrendo e o Escravo Rebelde, e encontram-se no Louvre em Paris. Estas seriam para colocar nas pilastras do andar inferior.
De estas destacam-se a sensualidade do Escravo Morrendo e a sua postura de aceitação, não resistência perante a morte.
Enquanto isso, o Escravo Rebelde, de rosto não polido e corpo contorcido e em posição instável, parece resistir à morte, negando-se a subjugar-se, fazendo força para sair da prisão.
Outras quatro obras resultaram desse período e essas glorificam o "non finito". A força expressiva é impressionante nestas obras, pois percebemos como o artista liberava as figuras dos maciços blocos de pedra.
E ao deixá-las inacabadas, estas acabam funcionando como alegorias para um dos temas que acompanhou e atormentou toda a obra e vida de Michelangelo: o corpo como prisão da alma.
Apesar de ser a mais bela de todas, o corpo, a matéria, era para ele uma prisão para o espírito, assim como os blocos de mármore eram prisões para as figuras que ele ia liberando com seu cinzel.
Com este grupo de quatro esculturas vemos essa batalha sendo travada, e como parece ser dolorosa essa prisão para as figuras que se cobrem ou contorcem com o peso ou o desconforto dessa escravidão da alma.
8. Túmulos de Lorenzo de' Medici e Giuliano de' Medici
Em 1520, Michelangelo é contratado por Leão X e o seu primo e futuro Papa Clemente VII, Giulio de' Medici, para realizar uma capela funerária em San Lorenzo, em Florença, para conter os túmulos de Lorenzo e Giuliano de' Medici.
De início os projetos entusiasmaram o artista que com fervor garantiu ser capaz de os realizar ao mesmo tempo. Mas vários problemas se apresentaram no caminho e tal como no túmulo de Júlio II, também para estes o que fora inicialmente sonhado se perdeu pelo caminho.
O projeto idealizado por Michelangelo tinha por princípio a comunhão entre a escultura, a arquitetura e a pintura. Mas as pinturas para os túmulos nunca chegaram a ser realizadas.
Quando trabalhava nos túmulos dos Medici, rebentou uma revolução em Florença contra os mesmos e perante esse cenário Michelangelo parou o trabalho e colocou-se ao lado dos revoltosos.
Mas quando a revolta foi esmagada, o Papa perdoou-o com a condição que ele retomasse os trabalhos, e assim, Michelangelo voltou a trabalhar para aqueles contra quem se tinha revoltado.
No final, quando Michelangelo deixa Florença de vez em 1524 rumo a Roma, a obra foi deixada incompleta e as esculturas que ele realizara foram mais tarde colocadas nos devidos lugares na Capela Medici por outros.
O que até hoje chegou a nós são dois túmulos parietais gêmeos e colocados frente a frente na Capela. De um lado o de Lorenzo no qual este é representado em posição passiva, contemplativa, pensando, aproximando a figura da forma como o verdadeiro Lorenzo de' Medici vivera.
Do outro lado Giuliano, no seu tempo glorioso soldado, é representado de forma ativa, com armadura e dotado de movimento. A perna esquerda parece querer levantar a figura colossal e poderosa.
Aos pés de ambos deitam-se duas alegorias, a Noite e o Dia (Túmulo de Lorenzo de' Medici), o Crepúsculo e a Aurora (Túmulo de Giuliano de' Medici).
Sendo que o Dia e a Aurora são as figuras masculinas e a Noite e o Crepúsculo as figuras femininas, e os rostos das alegorias masculinas estão inacabados, não polidos.
9. As últimas Pietàs
Michelangelo chegou aos últimos anos da sua vida possuindo força física e necessidade de trabalhar, porém, seu espírito carregava inúmeros arrependimentos e tormentos.
Pois chegou à conclusão que durante parte da sua vida percorrera um ideal errado, o ideal de beleza e perfeição na arte e a ideia que através dessa arte se chegaria a Deus.
Assim, seus últimos anos são voltados para a sua outra paixão, o divino, e talvez por isso suas derradeiras obras têm o mesmo tema e foram deixadas inacabadas.
A Pietà e a Pietà Rondanini são dois mármores inacabados, e em especial a Rondanini, é profundamente expressiva e perturbadora.
Como alegoria a todo o sofrimento e espírito turbulento que Michelangelo carregou a vida toda, e em especial nesses últimos anos de vida e criação, ele esculpiu o rosto da Virgem carregando o filho morto, na Pietà Rondanini, com seus próprios traços.
Abandonando assim o ideal de beleza humana que o perseguira a vida toda, e dizendo com esta obra que apenas na entrega total a Deus se pode encontrar felicidade e paz.
Em 1564 Michelangelo morreu aos 89 anos, e até ao fim manteve suas capacidades físicas e mentais.
O Papa mostrara vontade de o sepultar em San Pietro, em Roma, mas Michelangelo antes de morrer deixara clara sua vontade de ser sepultado em Florença, de onde partira em 1524, regressando assim à sua cidade apenas depois de morto.
Leonardo da Vinci: 11 obras fundamentais
Leonardo da Vinci foi pintor, escultor, arquiteto, engenheiro militar, mas seu nome ficou para a História ligado à pintura, e aqui olharemos para 11 de suas obras fundamentais por ordem cronológica.
1. A Anunciação
Pintada entre os anos 1472 e 1475, A Anunciação é um óleo sobre madeira e representa os primeiros passos de Leonardo na pintura, apesar de nem todos concordarem com o veredito.
Esta obra esteve "escondida" em um mosteiro até 1867 quando foi transferida para a Galleria degli Uffizi, em Florença, sendo a pintura atribuída a Domenico Ghirlandaio, um pintor contemporâneo de Leonardo e também aprendiz na oficina de Verrocchio.
Mas posteriores estudos e análises à obra dão base à teoria que esta pintura é um dos primeiros trabalhos de Leonardo. Na verdade, terá sido um trabalho realizado em conjunto, pois ao analisar a obra percebeu-se que a base da mesma terá sido executada pelo mestre Verrocchio, assim como a Virgem.
Leonardo terá executado o anjo, o tapete de flores e o fundo (o mar e as montanhas). Isso fica claro na precisão científica com que foram pintadas as asas do anjo, e na descoberta de um desenho preparatório para as mangas do anjo atribuído a Leonardo.
Também parece óbvia a diferença entre a delicadeza do anjo e a majestade quase fria da Virgem. Da mesma forma temos já aqui o uso do claro-escuro e do sfumato.
Em termos de tema, temos a representação do momento bíblico em que o anjo visita a Virgem para lhe dizer que ela irá dar à luz o messias, filho de Deus.
2. Retrato de Ginevra de’ Benci
O Retrato de Ginevra de' Benci foi pintado por Leonardo entre os anos 1474 e 1476. É um óleo sobre madeira e a figura retratada é Ginevra de' Benci uma jovem aristocrática de Florença, famosa e admirada pela sua inteligência.
A cabeça da jovem encontra-se emoldurada pelas folhas de um arbusto de zimbro, e ao fundo pode contemplar-se uma cuidada paisagem natural.
A expressão da jovem é severa e altiva, e como a maioria das mulheres dessa época, também Ginevra raspou as sobrancelhas.
O tamanho da obra foi encurtado, pois originalmente chegaria até depois da cintura da jovem e incluiria a representação de suas mãos descansando sobre seu regaço.
3. A Virgem das Rochas
A Virgem das Rochas é um óleo sobre madeira e foi executado cerca de 1485. Aqui, as figuras encontram-se à frente de uma gruta e as suas formas estão envoltas em uma bruma (sfumato) que confere à pintura uma característica quase surreal.
Esta composição é um perfeito exemplo do domínio do claro-escuro na pintura de Leonardo, assim como do sfumato.
O tema tratado nesta pintura é único e enigmático, pois temos representados São João em menino a adorar Jesus na presença da Virgem e de um anjo.
O significado desta composição não é de fácil definição, mas talvez o segredo esteja na utilização do gesto (detalhe caraterístico e de grande importância para o artista).
Cada figura está reproduzindo um gesto diferente, e aqui como outras figuras em outras pinturas, o anjo aponta com seu dedo indicador, neste caso não para cima, mas na direção de São João.
Enquanto isso, a Virgem protege, São João está em posição de adoração e o Menino Jesus está benzendo.
4. Homem Vitruviano
Por volta do ano de 1487, Leonardo criou o Homem Vitruviano, um desenho de tinta em papel, de duas figuras masculinas sobrepostas com braços e pernas separadas dentro de um círculo e um quadrado.
O desenho está acompanhado de notas baseadas na obra do famoso arquiteto Vitruvius Pollio. É considerado um estudo das proporções e uma perfeita justaposição entre ciência e arte, assim como é um dos trabalhos mais identificativos do artista, cientista e inventor que foi Leonardo da Vinci.
5. Dama com Arminho
A Dama com Arminho é um óleo sobre madeira pintado por volta dos anos 1489-1490 por Leonardo. A figura representada é Cecilia Gallerani, alegadamente uma amante do Duque de Milão, Lodovico Sforza, para quem Leonardo trabalhou.
Devido a diversas intervenções ao longo dos séculos o fundo original da pintura desapareceu e foi totalmente escurecido, parte do vestido foi acrescentado assim como o cabelo ao redor do queixo.
Análises à pintura revelaram uma porta no fundo original. Além disso descobriu-se também que Leonardo terá mudado de ideias ao pintar a figura e que originalmente a posição dos braços da dama seria diferente e que arminho foi acrescentado posteriormente.
A sobrevivência desta pintura até aos dias de hoje é quase um milagre, pois desde 1800 quando foi comprada por um príncipe polonês, sofreu diversas repinturas, exílio e esteve em esconderijos devido a invasões e guerras. Em 1939, depois da invasão nazista, a pintura foi encontrada com uma pegada de um soldado das SS.
6. La Belle Ferronière
Pintada entre os anos 1490 e 1495, La Belle Ferronière é um óleo sobre madeira. A figura representada será de uma mulher desconhecida, uma filha ou esposa de um ferreiro.
Esta pintura é uma dos únicos quatro retratos do pintor, sendo que as outras três são a Mona Lisa, A Dama com Arminho e o Retrato de Ginevra de’ Benci.
7. A Última Ceia
A Última Ceia é uma pintura mural executada por Leonardo entre os anos 1493-1498 na parede do refeitório do Convento de Santa Maria Delle Grazie em Milão.
Esta é a obra que vai dar notoriedade ao artista. Mas infelizmente, e devido ao fato de Leonardo ter pintado a composição com uma técnica de têmpera de óleo em vez da habitual têmpera de ovo, a obra começou a deteriorar-se pouco depois da sua finalização.
Hoje temos que fazer um esforço para imaginar todo o esplendor da pintura original, sendo que é quase um milagre ainda podermos contemplar a obra.
Tal como indica o título, a pintura representa a última ceia entre Cristo e os seus discípulos. O messias encontra-se bem no centro da composição e atrás da sua cabeça situa-se o ponto central de fuga em termos de perspetiva.
Por cima da cabeça de Cristo um frontão exerce a função de uma espécie de auréola, dando mais uma indicação de como a arquitetura nesta pintura serve de apoio às figuras que representam o foco fundamental.
O momento captado será o após Cristo anunciar que um dos seus discípulos o irá trair, algo que se fundamenta na gesticulação agitada das figuras à volta de Cristo em oposição à sua calma e passividade.
8. Salvator Mundi
Salvator Mundi é um óleo sobre tela, possivelmente pintado entre os anos 1490 e 1500, alegadamente para o rei Luís XII de França e sua consorte, Ana, Duquesa da Bretanha.
Durante os anos 1763 até 1900 a pintura esteve desaparecida e acreditou-se ter sido destruída. Depois foi descoberta, restaurada e atribuída a Leonardo, porém, existem muitos estudiosos que consideram essa atribuição como errada.
Mas em novembro de 2017 a obra foi a leilão como sendo de Leonardo e foi vendida, para um anônimo comprador, estabelecendo um novo preço recorde para uma obra de arte vendida (450.312.500 de dólares).
A composição apresenta um Cristo salvador do mundo, segurando um globo de cristal com sua mão esquerda e benzendo com a direita. Ele está vestido com trajos tradicionais da Renascença.
9. Mona Lisa
A Mona Lisa (também conhecida como A Gioconda) é um óleo sobre madeira pintado por Leonardo entre 1503-1506. Esta pintura retrata Mona Lisa, a jovem esposa de Francesco de Giocondo, segundo Giorgio Vasari (1511-1574, pintor, arquiteto e biógrafo de vários artistas da renascença italiana).
Esta obra foi adquirida por Francisco I, rei de França desde 1515 até 1547. Em 1911 a pintura foi roubada e recuperada em 1913.
Sobre esta obra há incontáveis teorias e especulações, mas a verdadeira maravilha da mesma não está apenas no sorriso enigmático, mas na técnica utilizada.
Aqui temos uma introdução à perspetiva atmosférica que tanto vai influenciar o Barroco e Velázquez mais tarde. Neste retrato Leonardo colocou a figura em primeiro plano pintando-a com nitidez enquanto a paisagem é representada de forma suave e progressivamente esbatida.
Assim temos a ilusão de afastamento, e olhando a pintura sentimos que a figura feminina está próxima de nós, enquanto a paisagem se afasta, e onde o olhar se perde no horizonte quase não se distinguem mais as formas. Esta é uma perfeita utilização do sfumato e da perspetiva atmosférica (aérea).
Em relação à figura em si, e ao seu famoso sorriso, uma expressão semelhante encontra-se em outras figuras da obra do artista (Santa Ana e São João Evangelista na Última Ceia, por exemplo).
Porém, o sorriso pode ter sido apenas a representação fidedigna da disposição da modelo, ou até influência do sorriso arcaico da arte grega (ver imagem Koré) da época clássica que tanto influenciou a arte da renascença.
10. A Virgem e o Menino com Santa Ana
Esta pintura, óleo sobre madeira, foi executada em 1510 por Leonardo. Nela estão representadas três figuras bíblicas: Santa Ana, sua filha a Virgem Maria e o menino Jesus. Sendo que o menino segura em suas mãos um cordeiro.
As figuras estão representadas em forma piramidal em frente a um fundo rochoso e pouco definido e onde parte dos contornos de Santa Ana se diluem no sfumato da paisagem.
Apesar da composição iconográfica ser de comum representação, o estranho nesta pintura é a posição de Maria, sentada no regaço de sua mãe, Santa Ana.
11. São João Batista
São João Batista é um óleo sobre madeira, pintado por Leonardo entre os anos 1513 e 1516. É possível que tenha sido a última obra do artista, já nos últimos anos da Renascença e no início do Maneirismo.
Nesta pintura São João tem o dedo indicador da mão direita apontando para o céu (um gesto fartamente repetido nas obras do artista), talvez reforçando a importância do batismo para a salvação da alma.
Esta representação da figura de São João Batista vai contra todas as demais até então que apresentavam o santo como uma figura magra e feroz.
Aqui ele é representado sobre um fundo escuro e indecifrável, e com traços para muitos mais femininos que masculinos. Sua postura, envolto na pele de cordeiro, é mais de sensualidade, um sedutor, fazendo lembrar as figuras dos sátiros da mitologia grega.
A obra é inquietante e perturbadora. A característica andrógina da pintura de Leonardo fica mais uma vez em evidência nesta obra, assim como o domínio da técnica do claro-escuro. Além disso, esta representação de São João Batista repete o sorriso encontrado em outras figuras como a Mona Lisa ou Santa Ana.
Curiosamente, quando Leonardo aceitou o convite de Francisco I para se mudar para França em 1517, esta pintura, juntamente com a Mona Lisa e A Virgem e o Menino com Santa Ana, foram as três obras que ele decidiu levar consigo.
Biografia
Leonardo (1452–1519) nasceu em uma pequena localidade perto de Florença, Vinci. Como era filho ilegitimo de um notário e uma mulher que provavelmente teria sido uma escrava, ele foi retirado da mãe com apenas 5 anos e com 14 anos entrou para a oficina de Verrochio como aprendiz.
Sem sobrenome, passou a ser conhecido como Leonardo da Vinci. O seu nome completo seria Leonardo di ser Piero da Vinci, que significa Leonardo filho de (Mes)ser Piero de Vinci, dado que a paternidade de Leonardo é atribuída a Messer Piero Fruosino di Antonio da Vinci.
Apesar do seu nome ter ficado na história sobretudo ligado à pintura até nós apenas chegaram pouco mais de 2 dúzias de pinturas atribuídas a ele. A razão para isso é que ele não foi um pintor muito prolífero.
Mente curiosa, interessou-se por tudo, mas na verdade não se dedicava plenamente a nada. Porém, o seu contributo e influência para a pintura, e a arte em geral, é inegável e chega até aos dias de hoje,
Para Leonardo a pintura era a arte por excelência, pois o pintor acaba suas obras com o esforço da razão, logo é um intelectual, enquanto o escultor acaba suas obras com o esforço físico.
Esta e outras ideias, contribuíram para o desentendimento que durante anos foi alimentado entre Leonardo e Michelangelo (para quem a escultura era a arte maior e que considerava a pintura a óleo como algo próprio para mulheres).
Como já foi referido, Leonardo frequentou a oficina de Verrochio enquanto jovem, e consta que apesar de até nós não ter chegado nenhum retrato do jovem Leonardo, que a escultura de o Davi de Verrochio contém os traços de Leonardo que em jovem possuíra um porte bastante atraente.
No ano de 1476, ainda na oficina de Verrocchio, Leonardo foi acusado de sodomia, e posteriormente absolvido da acusação.
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